19 agosto 2007

Estado Mínimo

Me leva para a outra margem do rio? Perguntou o escorpião.
De jeito nenhum, você vai me picar e eu vou morrer! Respondeu o sapo.
Mas se eu te picar você afunda e eu morro junto, eu nunca faria isso! Disse o escorpião.
Você tem razão, então vamos lá. O escorpião subiu nas costas do sapo e partiram. Mas, quando estavam no meio do rio, o escorpião picou o sapo. O sapo já desfalecendo perguntou para o escorpião: Por que você fez isso? E o escorpião respondeu: Não pude evitar, é a minha natureza.
Está gravado no DNA do capitalismo, e se fosse remédio deveria vir indicado na bula – Atenção! Efeitos colaterais já observados em diversos pacientes: causa acumulação e concentração de renda. Se persistirem os sintomas procure um especialista.
O capitalismo é selvagem, arredio a controle central e arisco à presença de qualquer objetivo que não seja o lucro. Ao menor sinal de perigo, corre ou ataca. É a natureza dele.
Marx, cidadão de outros tempos e outras paradas, previu o colapso do capitalismo e pregou o Estado Máximo, proprietário da máquina e da decisão, como o único antídoto capaz de combater a exclusão social que o capitalismo gera em sua ânsia de acumulação e concentração. Sua idéia de um estado onipotente e onisciente, que conhecedor do bem e do mal era capaz de determinar o que era bom para todos e, por conseguinte bom para cada um, foi detonada pela natureza ego-centrista e relativista do homem.
Noutros tempos e lugares, os neoliberais propõem o Estado Mínimo, apostando todas as suas fichas na liberdade de mercado. Mas como Marx, esqueceram a natureza do seu objeto de estudo – o capitalismo, e entregam as chaves do galinheiro à raposa. Talvez, no hemisfério dos anglo-saxões, com os problemas básicos de sobrevivência já resolvidos, faça sentido um mercado mais livre e competitivo. Mas, pela altura do Trópico de Capricórnio, onde o Brasil lidera uma longa fila de nações que precisam encarar e resolver, de uma vez por todas, o problema da miséria e das desigualdades sociais, isso não faz muito sentido.
Com 40 milhões de cidadãos vivendo abaixo da linha de subsistência, o Brasil não pode se dar ao luxo de deixar o mercado, e principalmente, o seu povo entregue às leis do mercado. Seria a Lei da Selva, só sobreviveriam os mais fortes, e aqui o mais forte é aquele que tem mais dinheiro.
Não cabem em uma situação como essa, frases de salão do tipo: é melhor ensinar a pescar do que dar o peixe. A turma está morrendo de fome e não tem tempo para aprender, só para sobreviver. Tão pouco, políticas assistencialistas, que isoladas e sem um plano de recuperação, nada fazem além de adiar o problema. O Fome Zero, descolado de um programa de recuperação e desenvolvimento de longo prazo, não passa de palanque eleitoral inócuo e hipócrita. Por outro lado, qualquer programa de desenvolvimento sem assistência efetiva e urgente à essa população é igualmente inócuo e hipócrita, uma vez que esse exército de miseráveis corroerá qualquer tentativa de decolagem.
Então como ficamos? A miséria corroe a economia e a economia, em seu modelo de produção capitalista, corroe as classes menos favorecidas. Marx não tinha razão, afinal não foi o capitalismo que se afogou em suas próprias lágrimas, e o modelo neoliberal não se aplica à nossa realidade de diferenças e desequilíbrios tropicais.
No meio do caminho, Keynes percebeu a grande capacidade do modelo de produção capitalista e propôs alguns ajustes a essa poderosa máquina de gerar produto, para que a mesma também pudesse gerar correções de rumo e evitasse assim o colapso profetizado por Marx. Keynes entendeu o Governo como um agente de grande porte que poderia, visando a economia como um todo, ajustar as engrenagens na direção do bem-maior do todo. Mas, atenção! Como dizia Mr. Keynes: "No longo prazo estaremos todos mortos".

3 comentários:

Anônimo disse...

Parabenizo-o pelo seu blog. Todo espaço para criticas e debates sobre o nosso país tem o meu apoio incondicional. Claro, só estarei do seu lado em suas ilações e análises, se os seus argumentos conseguirem tocar o meu coração e a minha razão. Eles têm que estar em sintonia com as minhas análises e principalmente com os meus interesses. Não aceito que ninguém seja o salvador da pátria. Não luto para ser um Messias. Nem gosto de quem assim o faz. Eu luto por um mundo ideal em que todos possam participar e usufruir do país que nossos pais, avós, tataravós, índios e curumins deixaram para nós, porque isto é bom para mim e para a minha família. Por isso o meu esforço concentra-se na busca e na luta por regras sociais em que a harmonia política possa perdurar. O equilíbrio político vem em primeiro lugar. Ele é mais importante do que o equilíbrio econômico. Se proselitismo quisermos fazer, deverá ser exclusivamente por nossa conta ou mesmo para preservarmos o equilíbrio social. É assim que eu encaro os programas tipo bolsa-familia. Mas o ideal é que tenhamos um conjunto de leis e regras – nosso ordenamento jurídico – que estabeleçam as boas leis. Uma constituição liberal tinha esta missão. A lei do usucapião em terras públicas – não em privadas – tinha esta missão. E muitas outras leis que nunca tivemos ou se tivemos foram retiradas do nosso arcabouço jurídico poderiam ser invocadas para esse fim.

O contexto social importante é o do estabelecimento de regras que permitam principalmente os mais humildes encontrarem um caminho de sobrevivência e de trabalho fora das garras do poder econômico, posto que só assim a harmonia social poderá viger. Todos lembram, não faz muito tempo que foram extintas, da prática dos coronéis em coibir e mesmo proibir que os filhos dos lavradores e demais pessoas ligadas aos seus negócios freqüentassem as escolas, mesmo que fora de sua propriedade. Eles estavam agindo num contexto coerente com a sua estratégia empresarial. Mas completamente distante de um mundo harmonioso em que as oportunidades de negócios presentes ou futuros devam ser preservadas. Olhe para qualquer cidade do interior brasileiro com até 60 mil pessoas. Verás que as oportunidades de negócios são limitadas. Olhe para a bagunça orçamentária federal, estadual e municipal. Verás que as oportunidades de negócios são limitadas. Olhe ao seu redor. Verás que estamos vivendo numa ilha de fantasia chamada Brasília. Há muito o que fazer para retomarmos a trajetória genuinamente democrática que tínhamos antes do golpe militar de 1964. A nova-república não tem nada de novo. Pelo contrário. Tem o mofo da política do café com leite que na verdade está mais para café do que para leite. É importante a sua participação política, mesmo que gostes de café. Conte comigo nessa empreitada.

É o que penso.

Sucesso em sua empreitada

Marco Bittencourt

Marcelo Ladvocat disse...

Valeu Profº Bittencourt, vamos debatendo na direção do sucesso!

Anônimo disse...

Olá Marcelo, para variar você arrasou com esse blog. Como sempre com uma crítica saudável e bem fundamentada. ESSE É O MARCELO QUE CONHEÇO!
Quanto aos comentários do texto, me veio à cabeça algo sobre o Fome Zero. Sempre defendemos uma renda básica universal. No entanto, a sua implantação é, de imediato, excluída pela inviabilidade política, pela carência orçamentária corriqueira, inviabilidade econômica e, convém enfatizar, considerando as mazelas do Fome Zero, a inviabilidade administrativa. Trata-se de mais uma política assistencialista que consegue vislumbrar o social dissociado do econômico. O que não deveria acontecer.
O que o Brasil precisa, na verdade, é de mais liberdade individual e econômica, de enxugar a máquina tornando-a mais eficiente (não ausente), sendo menos omisso. O fato é que nosso internacional presidente está fazendo muito pouco para que o país atinja um padrão de geração e distribuição de renda que acabe com tanta pobreza e violência.