19 maio 2007

JABOTI NÃO SOBE EM ÁRVORE

A menor taxa de câmbio dos últimos 5 anos é um sinal de que as coisas vão bem ou é mais um motivo de preocupação? Em primeiro lugar devemos entender o que é taxa de câmbio. Em uma sociedade moderna, todos os bens e serviços têm um preço. Ou seja, podemos comprar e comparar bens e serviços pelo seu valor monetário. Assim também é o dinheiro, que podemos dizer que tem como expressão do seu valor os juros, e as moedas estrangeiras que são comparadas ou trocadas pela taxa de câmbio (no Brasil expressa em dólares).
O Brasil já passou pelo regime de taxa fixa e pelo regime de bandas, no qual o Banco Central intervêm cada vez que o câmbio ultrapassava limites pré-estabelecidos de máximos e mínimos. Atualmente no Brasil prevalece o regime que chamamos de dirty floating - sistema híbrido no qual o câmbio é livre, porém, o BC intervêm buscando manter níveis que ele considera apropriados ao momentum econômico. Esses patamares são evidentemente camuflados pelas autoridades monetárias com o intuito de dificultar a especulação. Imagine quanto vale a informação de que o dólar está em determinado nível, que esse nível está abaixo do patamar considerado apropriado e que, por conseguinte ele vai entrar no mercado comprando um volume expressivo de moeda! Ora, não é difícil perceber que o valor do dólar vai subir e quem antecipar esse movimento de compra do BC, comprando na baixa (antes da compra do BC) vai ganhar dinheiro vendendo na alta (depois da compra do BC). Na verdade isso não é muito estranho aos iniciados na especulação desse mercado. Costuma-se inclusive, acompanhar as datas de pagamentos da dívida externa, que naturalmente representam demanda por dólar e que conforme o nível de estoque de divisas pode indicar um movimento de compra do BC.
Então por que o dólar continua caindo? Como um animal selvagem o capital busca alimento fácil e o capital internacional tem encontrado esse alimento fácil na taxa de juros brasileira. Com a atraente taxa de juros, em contrapartida às baixas taxas de juros internacionais, o pior do capital internacional – o capital especulativo – aporta em águas nacionais e aumenta a oferta de dólares no mercado. Com o aumento da oferta de dólares, seu preço – a taxa de câmbio – cai. Aliado à grande oferta de dólares na economia, a falta de um controle específico de capital (entra e sai com facilidade) e a estabilidade econômica nacional, acrescente ainda a isso, a proposta de isenção de imposto para o investimento externo da MP 281.
Parece que o atual governo fez uma opção pela manutenção de altos níveis de estoques de capital especulativo. Esse animal selvagem e nada altruísta que avança faminto atrás das facilidades que estranhamente oferecemos, é agora incentivado com uma renúncia fiscal exclusiva a estrangeiros. Somente uma visão míope de curto prazo (um mandato?) poderia buscar incentivar o capital especulativo em detrimento a qualquer outro estímulo ao capital construtivo. Não nos importa o emprego? Não nos importa o crescimento e o desenvolvimento? O que justifica o Estado senão o bem-estar comum, o bem-estar do povo? E o caminho para o bem-estar não é o crescimento e o desenvolvimento, que geram emprego e prosperidade? Os bancos batem recordes atrás de recordes de faturamento e rentabilidade, recordes mundiais! Os bancos que cada vez mais automatizados e informatizados, desculpem a redundância, geram cada vez menos empregos para o brasileiro desqualificado (pela mais absoluta falta de acesso à educação de qualidade). Você consegue imaginar aumentar seus lucros em mais de 40% de um ano para o outro? Pois é, os bancos estão realizando essa "façanha". Sistematicamente. Estamos promovendo a maior transferência de riqueza da história nacional. Estamos na contra mão das nações desenvolvidas, desviando riqueza do setor produtivo para o setor especulativo. O que faria um empreendedor de bom senso investir tempo e dinheiro no setor produtivo? Com todos os entraves burocráticos, tributários e trabalhistas que o poder público impõe, sua margem de lucro é ínfima e o risco altíssimo! Na especulação financeira é incentivado por isenções de impostos, facilidades burocráticas, inexistência de obrigações trabalhistas e margens fantásticas originadas de taxas de juros plutanianas. Sinto dizer que o empresário do setor produtivo, diante desse cenário, é um insensato.
Poeira não é fumaça, jaboti não sobe em árvore e eu não acredito em Saçi Pererê. Mas, com uma taxa de juros venusiana (ué, não era plutaniana? Bom, é de outro mundo do mesmo jeito!), uma carga tributária tão ignóbil quanto o mensalão e uma taxa de câmbio tão desanimadora quanto a "Pizzaria do Planalto", não dá para dizer que estamos planejando a construção de um modelo de desenvolvimento sócio-econômico. Estamos alimentando o pior do capitalismo, sua vertente selvagem. E matando o seu melhor, que é ser o modelo de produção mais eficiente jamais visto na história da civilização.
Nesse modelo especulativo, não há lugar para a fraternidade ou compaixão. Como ignorar 40 milhões de miseráveis, sem qualquer esperança de uma única oportunidade espontânea do mercado? O modelo anglo-saxão de livre mercado é próprio para países que não conhecem a miséria e a desesperança. Não podemos simplesmente importar um modelo de sucesso no hemisfério norte e ficar sentado esperando que as coisas aconteçam no longo prazo. Já dizia Keynes que no longo prazo estaremos todos mortos. Ensinar a pescar, é certamente mais eficiente do que dar o peixe. Mas, é preciso que ele suporte a fome do "período de aprendizagem", não é verdade? Então, temos que ter um programa de governo que ensine a pescar e dê o peixe ao mesmo tempo. Devemos criar um modelo de educação integrada e inclusiva e acima de tudo assistir as necessidades básicas e imediatas dessa gente brasileira. Se você acha que a lei da selva é a mais apropriada, ou é venusiano ou não é cristão! Vivemos em um país pródigo em diversidades, o que poderia até ser bom não fossemos também um país pródigo em concentração de riqueza e poder.
Não dá mais para esperar o bolo crescer primeiro para dividir depois. Temos que partilhar, contribuir e participar. Mas, só podemos fazer isso com um plano decente de governo e não com políticas assistencialistas e eleitoreiras.
Finalizando, eu não diria que o câmbio baixo é conseqüência ou sinal de que algo não vai bem. É pior que isso! É pura ineficiência de gestão macroeconômica. Vivemos em um país em que os juros altos incentivam a especulação, a carga tributária incentiva à informalidade e o câmbio incentiva o produto importado. Estamos colocando azeitonas na empada do vizinho. Estamos incentivando o emprego do gringo.
Bons tempos aqueles em que o problema nacional era a saúva, porque hoje ou acabamos com a miséria ou a miséria acaba conosco! É hora de indignação e de ação. Mãos à obra!