19 maio 2005

POLÍTICA ECONÔMICA OU ECONOMIA POLÍTICA

Afinal, a economia brasileira sofrerá as conseqüências da crise política?
Essa é uma pergunta de um milhão de dólares e seguramente a que mais tenho ouvido onde quer que eu vá.
Muito embora já seja quase um consenso que isso tudo não vai acabar em pizza. Ainda não ficou claro o “alcance das garras da mussarela”. Quem vai se enroscar e quem vai se safar?
Mas, voltemos à pergunta que não quer se calar: a economia está blindada? Quando argüido de questões mais técnicas, gosto de “pensar junto” com meu interlocutor levando-o a tirar suas próprias conclusões, mesmo que intuitivas. Por exemplo: você montaria um negócio em uma cidade conturbada pela mais vil das crises políticas? Claro que não! Pois bem, é dessa mesma forma que raciocinam os investidores na hora de tomar uma decisão dessa natureza. Então o que adiantaria alguém dizer para você que questões políticas não afetam os negócios e que os fundamentos econômicos estão sólidos e isolados dessas questões? Você não é um iniciado nem domina o economês, mas sabe muito bem que jabuti não sobe em árvore e em questão de dinheiro todo cuidado é pouco.
É realmente estranho toda a mídia repetindo sem parar a questão da blindagem econômica. Isso não existe! O que é possível é uma mitigação de alguns dos efeitos da crise. Mas blindar, isolar a crise é discurso. Como se tivessem descoberto o Graal dos tecnocratas – como fazer economia sem política ou política sem economia –. Quem vai fazer isso, o Palocci sem o Lula ou o Meireles sem o Mantega?
O que tem que ser feito, alunos dos primeiros anos do curso de economia já sabem. O problema não é técnico, é político-econômico. Então como isolar uma coisa da outra?
Nesse momento chegam os carregadores de números e estatísticas que calam os menos avisados com uma enxurrada de dados, de que a economia vai bem etc. Entretanto é importante uma análise comparativa desses dados ou você acabará inexplicavelmente afogado em um rio que tem em média apenas 30 cm de profundidade.
Imagine a seguinte situação: As 100 famílias da cidade de Bananas (fictícia) têm apenas os chefes de cada família empregada com $ 900 por mês, permanecendo desempregada todo restante da família. Dessa forma, em Bananas desemprego é substancial. Porém, um político populista se elege e promove algumas mudanças cosméticas na estrutura sócio-econômica da cidade. Bananas passa agora, a ter mais dois membros de cada família trabalhando e ganhando $ 400 cada um. Muito embora o chefe da família tenha perdido seu emprego, as autoridades anunciam com entusiasmo a expressiva queda do desemprego, dobrando o número de pessoas empregadas. Mas, notem que a renda familiar de $900, que anteriormente era a recebida apenas pelo chefe da família, caiu agora para $ 800, recebidos pelos dois outros membros da família ($400 cada um). Uma queda total de 11% nos rendimentos mensais de cada família.
Nas estatísticas de Bananas, como já falamos, é divulgada com destaque a queda do desemprego. Porém, a queda da renda média das famílias “aparece” misturada no meio de outros tantos números e não é discutida ou destacada em lugar algum.
Os empresários de Bananas vão ter alguma dificuldade para conseguir entender o porquê de, mesmo existindo mais pessoas trabalhando, ocorrerem mudanças nas cestas de compras (com substituição de itens de maior valor por itens de menor valor). Note que aumentou o emprego, mais pessoas passaram a consumir com suas próprias rendas, mas no geral a economia da cidade não melhorou. Esse é um bom exemplo de como uma informação pode ser manipulada e distorcer a percepção das pessoas e levá-las a juízos inadequados. Isso está acontecendo no Brasil hoje. O desemprego caiu, mas o salário médio também. Falamos do desemprego, mas não falamos do poder de compras das pessoas.
As exportações estão aumentando, mas sem grandes impactos internos importantes, além do estoque de divisas. Exploramos o mercado internacional com commodities que demandam pouca mão de obra. São mercados de uso intensivo de capital e não de mão-de-obra. A obsoleta infra-estrutura nacional de estradas, portos e ferrovias, que até agora tem sido ignorada pelo governo federal, gera desperdício e diminui nossa competitividade, incrementando ainda mais o custo-Brasil.
O investimento cai e a infra-estrutura se desfaz –¬ causas no curto prazo e conseqüências no longo prazo –. Quem vai pagar a conta?
Começamos esse artigo falando de investimento porque sabemos que economia – a ciência da escassez – é um cobertor curto, se cobrirmos a cabeça descobrimos os pés. Assim, o melhor caminho é o do crescimento e para isso o investidor é figurinha carimbada – vale mais.
As conseqüências já começam a aparecer. Segundo dados divulgados pela Comissão Econômica para a América Latina (CEPAL), o Brasil com 3,0% terá a 3a pior taxa de crescimento da região. Com essa taxa pífia de crescimento o Brasil estará na desonrosa 14a posição “ganhando” apenas das seguintes potências: Costa Rica, Equador, Guatemala e Haiti. A ex-falida Argentina (lembram?) já é a primeira com um crescimento de 7,3%. Para 2006, quando se projeta para o Brasil um crescimento de 3,5%, as expectativas são de que o Chile, com um crescimento estimado de 5,5%, lidere o bloco. Conforme explica o mesmo relatório, as projeções para 2006 são mais conservadoras por conta da esperada desaceleração da economia mundial.
Dessa maneira, gestores que apresentam estatísticas viezadas, como em Bananas, buscam faturar prestígio político agora, deixando a conta para as próximas gerações. Sem crescimento, a opção escolhida resulta em uma das maiores transferências de riqueza interna da história. A absurda tributação que ronda os 44% do PIB transfere recursos do setor produtivo para a máquina estatal – com o crescimento da “pizza ao invés do bolo”... –.
Todavia, não podemos esquecer a grandeza econômica do Brasil, muito maior do que toda essa lama do Congresso Nacional. Nem todas essas repetidas estórias de corrupção e pizza (então pizza alimenta corrupção?) têm nos impedido de levar nossa nação a uma condição mais democrática.
Assim, gostaria de concluir que blindagem é ficção, mas é obrigação dos tomadores de decisões macroeconômicas buscarem a mitigação dos efeitos dessa crise política na economia. É para isso que são pagos!

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